Artigo de Equipa Automundo
09-07-2020

Algumas das criações mais disruptivas, extremas e radicais da história da indústria automóvel são obra da Renault. Entre outros exemplos, quem não se lembra dos famigerados 8 Gordini, do icónico Renault 5 Turbo, do exuberante Clio V6 ou, mais recentemente, do radical Mégane R.S. Trophy-R? Mas nenhum deles reuniu o exotismo do Spider. Um desportivo puro-e-duro que, há 25 anos, resultou da mente de um grupo de engenheiros apaixonados pela condução e pelo trabalho de “mãos”, já que a sua produção era praticamente artesanal.

A saga do Renault Spider começou, em 1990, no Salão de Paris

A saga do Renault Spider começou, em 1990, no Salão de Paris, com um concept-car de nome bem mais prosaico: Renault Laguna Roadster. Apesar da designação e da associação ao futuro familiar da Renault não o indiciar, este protótipo de um desportivo sem teto, com um para-brisas quase residual (na prática era só um defletor de vento), de linhas baixas e esguias e com portas de abertura em tesoura, antecipava um desejo da administração da Renault de ter, na gama, um automóvel que vincasse o prazer de condução e, ao mesmo, catapultasse a imagem desportiva da marca.

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Pouco tempo depois, já com o caderno de encargos técnico definido e o primeiro estudo apresentado, o grupo de entusiastas engenheiros da Renault recebeu luz verde para avançar com uma versão de homologação de estrada que ajudasse a amortizar os custos de desenvolvimento. Nasceu assim o projeto W94, mais tarde rebatizado Spider Renault Sport.

Apresentado ao público no Salão de Genebra de 1995, o Spider começou a ser produzido na fábrica da Alpine, em Dieppe. Com o público rendido às linhas, o Spider ostentava, com orgulho, o “carimbo” da Renault Sport, a divisão desportiva da marca que, poucos anos antes, tinha ajudado a conquistar o primeiro título de Campeão do Mundo de Construtores na F1.

25 anos do Renault Spider, um clássico que ainda hoje nos faz sonhar

Mas o Spider não vivia só de “aparências”. O motor colocado em posição central-traseira e o leve chassis em alumínio permitiam (e permitem) sensações de condução únicas, tanto em estrada como nas pistas, com a versão de troféu a apelar aos clientes sedentos da emoção da competição, mas com custos controlados.

A pureza da conceção e a incessante “cura de emagrecimento” também se refletiu no interior quase despido de elementos superficiais que só fariam aumentar o peso. Os bancos tipo bacquet, o arco de segurança e a ausência de sistemas como o ABS, a direção assistida ou um simples aquecimento (chauffage), tornavam a utilização do Spider muito próxima da de um automóvel de competição, sensação ampliada pela ausência de tejadilho e de um para-brisas digno desse nome, o que convidava os dois ocupantes a utilizar capacete nas deslocações de maior distância.

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O baixíssimo peso do conjunto, similar ao de um Twingo da altura, ajudavam a potenciar as capacidades do motor 2.0 com 150 cavalos às 6000 rpm. Com uma cilindrada de 1998cc e um binário máximo de 185 Nm às 4500 rpm, o bloco F7R com uma cabeça de 16 válvulas (partilhado com o Mégane 16V e com o famoso Clio Williams) era mais do que suficiente para garantir retomas relâmpago a este peso-pluma. Mais importante do que a velocidade máxima (que na versão sem para-brisas chegava aos 213 km/h) eram os impressionantes 6,9 segundos nos clássicos 0 a 100 km/h.

O baixo peso, aliado à extrema rigidez e à inspiração nos automóveis de competição para a afinação de todo o conjunto, também proporcionavam um comportamento verdadeiramente excecional. As evoluídas suspensões de triângulos sobrepostos à frente e atrás, com barras estabilizadoras, a repartição de peso 42:58 (na versão com para-brisas) e a curta distância entre eixos permitiam uma agilidade ímpar, tanto em estrada como em pista. Enquanto a tração traseira e a ausência de ABS e de direção assistida faziam as delícias dos puristas pela relação ainda mais direta e sem “filtros” entre o homem, a máquina e o asfalto.

Mais conforto, o mesmo exotismo de sempre

Um ano após o lançamento, a Renault passou a oferecer uma versão com para-brisas convencional, uma solução que aumentava a proteção aerodinâmica dos ocupantes e permitia montar uma capota rudimentar para proteger o interior da chuva, mas que em nada afetava o exotismo do Spider.

Apesar desta nota de “conforto”, o Renault Spider manteve inalterado o seu espírito radical, com a ausência de auxiliares de condução, um interior despido, as portas de abertura em tesoura e o arco de segurança a marcarem a utilização e a fazerem a ponte para o mundo da competição automóvel. Nem o ligeiríssimo aumento de peso beliscou as prestações e muito menos o comportamento, que continuava (e continua) a ser um dos principais cartões de visita do Spider. A par com umas linhas e soluções técnicas que ainda hoje deixam estarrecidos os inúmeros fãs de um dos mais exóticos e focados Renault da história.

Das estradas para as pistas, uma evolução natural

A tradição da Renault na organização de alguns dos mais competitivos troféus monomarca de velocidade remonta a 1966, com o Troféu Renault 8 Gordini. Nos anos 90, o Troféu Spider fez jus a essa tradição, animando os programas de inúmeros Grandes Prémios de F1.

Em 1995, Christian Contzen, Diretor da Renault Sport, apresentou um concept-car de um “Spider Trophy”. Sem homologação para estrada e destinado exclusivamente para utilização em pista, o Spider Troféu era em tudo similar à versão com matrícula, embora com componentes mecânicos devidamente adaptados para utilização numa competição monomarca.

O motor 2.0 16V beneficiou de um sistema de injeção diferente, de um escape de competição e de uma nova gestão eletrónica para chegar aos 180 cavalos de potência, enquanto a transmissão recebeu uma caixa manual de dentes direitos e com seis velocidades. A distribuição da travagem podia ser ajustada no cockpit, o que permitia ao piloto “jogar” com o traçado da pista e tirar pleno partido da imensa rigidez do chassis do Spider.

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Esta versão de competição, da qual só foram produzidas 90 unidades, proporcionou emocionantes corridas nos programas dos Grandes Prémios de Fórmula 1 na Europa, dando à Renault uma acrescida visibilidade e aos espectadores um excelente espetáculo, já que pelas características inatas do Spider e pelo equilíbrio técnico, as provas eram muitíssimo disputadas.

Entre 1995 e 1999, saíram 1.726 unidades do Spider da fábrica da Alpine. Com a maioria a ser vendida no mercado interno Francês e Alemão (em Portugal foram vendidas 7 unidades entre 1996 e 1998), é natural que o Renault Spider seja uma visão muito rara nas nossas estradas, o que também contribui para o estatuto de culto que o arrojado roadster alcançou em Portugal e além-fronteiras.

Passados 25 anos após o lançamento comercial, o Renault Spider continua a ser um objeto de desejo para os fãs de automóveis verdadeiramente especiais e um tributo ao espírito de inovação, arrojo e coragem que está inscrito no ADN da Renault desde a sua fundação.

Percorra a galeria e veja mais fotos do Renault Spider.

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