Mazda RX500, do design inspirado no mundo da aviação ao sucesso como brinquedo
Apesar de pequeno (apenas 982 cc), o seu motor debitava 250 cv e atingia uma rotação máxima de 15.000 rpm, mais do que um Fórmula 1 da época, para uma velocidade máxima superior a 240 km/h.
Reduzido a uma dimensão de brinquedo, conquistando os quartos das crianças dos anos 70, o Mazda RX500 tornou-se numa verdadeira peça de coleção. Estávamos no ano de 1970: os Beatles lançavam o seu álbum “Let It Be” e a fracassada missão espacial Apollo 13 inspirou a mundialmente famosa frase “Houston, we have a problem”. Mas esse foi, também, um ano de muita agitação no mundo automóvel, com designs visionários em forma de cunha a dominar o visual dos denominados super-automóveis, em conjunto com uma série de fabricantes a testar o tecnicamente sofisticado motor rotativo, aplicando-o nos seus concept-cars.
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Foi neste contexto que a Mazda apresentou o RX500, uma proposta radicalmente angular e aerodinâmica mostrada na 17ª edição do Salão Automóvel de Tóquio, marcando o 50º aniversário da Mazda Motor Corporation. O automóvel desportivo amarelo de motor central tornou-se rapidamente no favorito das multidões, cativando o público com o seu design inspirado na aviação e as suas portas com abertura tipo borboleta. Equipado com a inovadora tecnologia de pistões rotativos, não foi uma surpresa o facto de o futurista Mazda RX500 gerar tanto interesse junto dos meios de comunicação social de todo o mundo.
Da sala de exposições para a caixa de brinquedos
Estas circunstâncias forneceram um excelente cenário para transformar o espetacular veículo numa miniatura, potencial reconhecido pela Matchbox que integrou o Mazda RX500 – num inédito tom cor-de-laranja – na sua coleção “Superfast”, em resposta ao lançamento da Hot Wheels, em 1968, marca do grupo Mattel, que apresentava eixos mais finos e novas rodas, tornando as miniaturas mais rápidas e as brincadeiras mais divertidas.
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E por que motivo decidiu a Matchbox incluir este super-automóvel japonês no seu portefólio? A marca concebia os seus produtos tendo especificamente em vista o mercado norte-americano, o seu maior mercado de vendas na época, marcando pontos com vários automóveis personalizados, que agradavam ao inconfundível gosto americano. Para acompanhar o ritmo, a Matchbox procurava, também, contar com automóveis futuristas fantásticos e concept-cars nas suas coleções, sendo que o Mazda RX500 satisfazia, na perfeição, esses requisitos do mercado norte-americano, numa altura em que a Europa demonstrava grande interesse na Mazda e no motor Wankel. Não admira que o Mazda RX500 cor-de-laranja da Matchbox, apresentado em 1971 como “MB66”, se tenha tornado imediatamente numa das miniaturas mais vendidas a nível mundial.
A ideia por detrás do Mazda RX500
Mas afinal o que levou a Mazda a lançar um veículo tão radical? O desenvolvimento de um protótipo criado para investigar o comportamento das carroçarias com uma elevada componente plástica e a dinâmica de condução a velocidades superiores a 200 km/h foi iniciado já em 1968 sob o nome de código “X810”. O objetivo era o de investigar a harmonia entre as pessoas e a velocidade numa sociedade do futuro, a partir da ideia de possíveis cenários de tráfego intermunicipal. Para tal era necessário um veículo experimental, de motor central, baixa resistência aerodinâmica e elevado downforce, em simultâneo com a suavidade de um motor rotativo. Em complemento, pretendia-se que o projeto para o que viria a ser o Mazda RX500 também fosse considerado como um potencial sucessor do Cosmo Sport 110 S, modelo que, à época, era o automóvel de referência da Mazda.
Uma equipa cuidadosamente selecionada produziu diversos modelos e estudou a sua resistência aerodinâmica no túnel de vento. Ao contrário do plano original de construção de um coupé, foi escolhida uma proposta de formato Shooting Brake, mais simplificada do designer Shigenori Fukuda, que oferecia menor resistência aerodinâmica. Para a conceção do Mazda RX500, Fukuda-san inspirou-se, entre outras soluções, no filme “2001: Odisseia no Espaço”.
O veículo deveria assemelhar-se o menos possível a um automóvel clássico, o que fez com que tivessem sido utilizados inúmeros elementos de design das corridas e da aviação na criação do Mazda RX500. Destaca-se, em particular, a secção traseira, com o seu visual invulgar, evocando a combinação entre uma nave espacial e um jato de caça. A inspiração também veio da colaboração de Fukuda-san com o fabricante italiano Carrozzeria Bertone, adicionando curvas e contornos suaves ao Mazda RX500.
Outra característica diferenciadora do design é o para-brisas envolvente. Com o pilar A totalmente oculto, as superfícies de vidro do veículo parecem fundir-se numa única peça, conferindo ao habitáculo uma aparência do tipo cúpula. A entrada no Mazda RX500 faz-se através de um par de portas do tipo borboleta. Mesmo quando está parado, este conceito da porta, tão familiar no mundo do automobilismo, criava uma sensação de dinâmica. Atrás delas estava um outro par de portas do tipo asas de gaivota e um capô bipartido longitudinalmente, de acesso ao compartimento do motor, onde se alojava o coração rotativo deste desportivo. Foi um detalhe que escapou à Matchbox ao criar o Speedster para crianças, escondendo o motor sob uma grande tampa de abertura tradicional.
No que se refere ao interior, os passageiros sentavam-se em dois bancos desportivos. As atenções eram atraídas para os três instrumentos semicirculares, colocados atrás do volante em pele com quatro raios, dispostos num tablier envolvente. O entretenimento também não ficou esquecido no Mazda RX500, com a consola central a alojar um rádio AM/FM, atrás da manete da caixa de quatro velocidades, solução trazida do Mazda Luce R130 Coupé.
Requinte técnico
O Mazda RX500 contava com um motor rotativo Tipo 10A de dois discos, arrefecido a água, montado centralmente, logo atrás do condutor. Com uma cilindrada de apenas 982 cc, alcançava uma potência de 250 cv, atingindo uma rotação máxima de 15.000 rpm, mais do que um Fórmula 1 da época, o que lhe permitia alcançar uma velocidade máxima superior a 240 km/h.
Tal decorria, principalmente, do seu peso reduzido – uns bem desportivos 850 kg – fruto da utilização de uma carroçaria de plástico, reforçada com fibra de vidro, e de uma estrutura tubular, resultando numa excelente relação peso/potência de 3,4 kg/cv. Com uma altura de 1,065 m, o desportivo de motor Wankel também está entre os mais achatados do mundo.
Luzes traseiras futuristas e cores que alimentaram os rumores
O Mazda RX500 viu-se equipado com um conceito futurista de luzes traseiras, com o objetivo de fornecer informações adicionais aos demais utilizadores da estrada, tornando o trânsito mais seguro. Por exemplo, o sistema de iluminação traseiro incluía um set de luzes vermelhas, amarelas e verdes, além das luzes de travagem vermelhas e luzes brancas de marcha-atrás, normais. Consoante a intensidade da travagem, as luzes vermelhas acendiam-se progressivamente para alertar o trânsito da retaguarda, para a eventualidade de uma travagem de emergência, semelhante ao atual sistema, que ativa as luzes traseiras intermitentes. As luzes amarelas acendiam à medida que a velocidade se reduzia e as verdes indicavam que o veículo estava, de novo, a acelerar.
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Entretanto surgiam, com alguma regularidade, fotos deste automóvel com diferentes cores, causando uma enorme especulação: terão, afinal, sido construídas diferentes versões do Mazda RX500? O restauro, em 2008, do veículo prateado forneceu as respostas, tendo a sua remodelação revelado camadas sobrepostas de tinta verde e amarela. Originalmente criado em verde, o modelo fora repintado de amarelo para o Salão Automóvel de Tóquio, já que todos os veículos da Mazda em exposição deveriam ser apresentados no mesmo amarelo-vivo, com interiores vermelhos. O Mazda RX500 continuou a criar zunzum em vários salões de todo o mundo, mas sem que conseguisse sair ileso de todas as suas viagens, razão pela qual foi, entretanto, pintado em prateado, a sua cor atual. Todas as esperanças de produção em série do Mazda RX500 foram frustradas pela crise do petróleo, de 1973. Como resultado, o Mazda RX500 continua, até hoje, a ser caso único, podendo ser apreciado no Museu do Transporte de Numaji, em Hiroshima.
De brinquedo a peça de colecionador
Felizmente, a crise não afetaria a edição em miniatura do Mazda RX500, sendo que após o seu lançamento, a réplica da Matchbox permaneceria à venda durante mais de 4 anos, até se ver relançado em 1975, num formato Streaker, em vermelho. A produção foi descontinuada pela primeira vez em 1976, surgindo depois, entre 1978 e 1985, noutras cores, em diferentes mercados. A pequena e bem-sucedida homenagem ao Mazda RX500 permaneceria, assim, nas prateleiras das lojas de brinquedos durante mais de uma década, acumulando milhares de vendas em todo o mundo.